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Moradia digna está em alta

Por Luiz Augusto Pereira de Almeida
Diretor da Sobloco Construtora e membro do Conselho Consultivo do Secovi-SP

É muito importante que o Governo de Transição, instalado em Brasília, governadores, senadores, deputados federais e estaduais que tomarão posse em janeiro deem muita atenção à nota técnica "Déficit habitacional no Brasil _ Impacto da cadeia produtiva da construção civil", produzida pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). O documento estima que o combate ao déficit habitacional no país possa gerar 3,2 milhões de postos de trabalho diretos e indiretos e um incremento de R$ 46,4 bilhões por ano em toda a cadeia produtiva do setor.

Para viabilizar a concretização desses números, seria necessário atender à demanda apontada em dados do Ministério do Desenvolvimento Regional, de um déficit de 5,9 milhões de moradias e a necessidade de investimentos anuais de R$ 228,7 bilhões para a construção de 1,2 milhão de unidades por ano, até 2030. Cabe aqui uma ressalva: se o cálculo incluir residências inadequadas, ou seja, sem infraestrutura básica, o quadro é ainda mais grave, alcançando cerca de 13 milhões de habitações.

Programas habitacionais da União, estados e municípios até hoje realizados são importantes, mas estão distantes de representar uma solução efetiva. Contemplam parcela pequena do déficit habitacional, que se torna mais preocupante com o crescimento demográfico e, agora, o aumento do desemprego e das dificuldades de financiamento decorrentes de mais de dois anos de pandemia, aumento das taxas de juros e da inflação, majoração de materiais de construção, desequilíbrio fiscal do Estado e instabilidade global decorrente da invasão da Rússia à Ucrânia.

Outro obstáculo no Brasil são os planos diretores restritivos da oferta de moradias. Estamos na contramão das mais avançadas tendências referentes à ocupação do solo urbano, que recomendam maior adensamento, recuperação dos espaços centrais para habitação e revisão dos protocolos de verticalização das construções. Isso acontece porque a legislação urbanística brasileira tornou-se complexa, confusa e conflitante. Com União, Estados e Municípios legislando sobre o solo urbano, numa espécie de federalismo cooperativo, e inúmeras entidades e órgãos da sociedade civil atuando, na maioria das vezes ideologicamente ou por interesses próprios, a cidade não consegue, em tempo hábil, formalizar um plano urbanístico e regulatório de desenvolvimento sustentável. Nessa briga sem vencedores, quem perde é aquele que precisa de uma moradia digna.

As cidades são organismos vivos que vão se adaptando às mudanças comportamentais do planeta. A pandemia da Covid-19 é um exemplo clássico. Surgiram novos hábitos, que vieram para ficar, nas maneiras de morar, trabalhar e se divertir. Não menos importante são as questões ambientais. Um plano diretor não pode ficar indiferente a isso. Trata-se de um instrumento que deve ser revisto constantemente. Talvez o prazo de dez anos estabelecido pela Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) seja incompatível com a velocidade e as necessidades que o mundo está exigindo.

De qualquer forma, algo não muda: a necessidade de todos terem moradia digna. Nossos legisladores e a sociedade civil têm de entender que políticas habitacionais eficazes, além dos investimentos, empregos e fomento do nível de atividade que geram são um relevante fator de inclusão social. É inadmissível que o Brasil, detentor de uma das maiores economias do mundo, tenha Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,765, inferior aos dos vizinhos Argentina, Uruguai, Peru e Colômbia.

Para que alcancemos um nível de oferta de residências dignas, em número compatível com a demanda, temos de ser mais ágeis, flexíveis, ousados, criativos e menos burocráticos e rixosos no planejamento urbano. Por isso, espera-se que as autoridades eleitas pelo voto dos brasileiros confiram máxima atenção a políticas de desenvolvimento urbano mais eficazes.

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